08/08/2024 às 12h05min - Atualizada em 08/08/2024 às 12h05min

Litio desperta interesse de empresas estrangeiras em cidades do Vale do Jequitinhonha

Em meio ao esforço global para reduzir o uso de combustíveis fósseis (petróleo, carvão mineral e gás natural) e ampliar a capacidade de energia renovável, o lítio, considerado estratégico nessa transição energética, colocou uma região no interior de Minas Gerais no foco de empresas estrangeiras: o Vale do Jequitinhonha, responsável pela maior parte da produção do metal no Brasil.
De cor branca acinzentada, o lítio tem aplicações diversas na indústria e ganhou destaque com o aumento na produção dos carros elétricos, já que é utilizado como matéria-prima para as baterias de longa duração desses veículos considerados menos poluentes.
 
A primeira empresa estrangeira começou a explorar o lítio na região em 2023, e há mais três mineradoras de outros países em fase de estudos para implantar outros projetos, uma delas com previsão para implantação ainda em 2024. Composta por municípios do norte e do nordeste de Minas Gerais com alguns dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), a região ganhou a denominação de “Vale do Lítio”.

O IDH é composto de três indicadores, longevidade, educação e renda, e varia de 0 a 1. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, quanto mais próximo de 0, menor o desenvolvimento humano. No Vale do Lítio, a cerca de 600 km de Belo Horizonte, esse indicador varia de 0,582 a 0,701.
 
O lítio já era explorado no Vale do Jequitinhonha décadas atrás pela Companhia Brasileira de Lítio, mas quando a multinacional canadense Sigma instalou sua planta de exploração no ano passado em Araçuaí, cidade com pouco mais de 34 mil habitantes, o grande número de trabalhadores chamados para a construção do projeto mudou a rotina do local.
“Nós vivenciamos uma movimentação muito intensa em hotéis, restaurantes, pousadas, supermercados... os imóveis que tinham aluguel de R$ 1 mil passaram a custar R$ 5 mil, Araçuaí recebia dois, três jatos por dia”, lembra o presidente da Associação Comercial Industrial da cidade, Marcos Antônio da Costa Miranda.


Há seis anos com um restaurante na mesma cidade, Mizael Santana Silva também teve que aumentar sua capacidade de atendimento e fechou contrato com duas empresas terceirizadas que trabalharam na implantação da mesma obra citada por Maurício.

"No pico, somente com essas duas empresas, nós chegamos a fornecer 400 marmitas por dia. Por conta da demanda, cheguei a ficar com 50 funcionários de carteira assinada, agora somos metade disso. Como o setor estava muito aquecido, pelos menos outros cinco restaurantes como o nosso foram abertos", relata Silva.
O empresário fala que após a construção da primeira planta de exploração do lítio, o movimento em seu comércio caiu 80%, mas que já espera ver a demanda aumentar novamente quando as novas empresas começarem as obras das suas plantas.

Foi um cenário que nós nunca tínhamos visto. Agora, estamos na expectativa da chegada de novas empresas, iremos nos estruturar de uma forma para não sentirmos tanto quando o pico passar", diz.
No Brasil, o lítio é extraído do espodumênio, um mineral que se forma em rochas chamadas pegmatito, entre 18 km e 26 km de profundidade, mas depois se realoca mais próximo da superfície, em até 200 metros. Em outros países, como Chile, Argentina e Bolívia, o metal é retirado dos desertos de sal.
Insumo com aplicações diversas, o lítio é utilizado nas indústrias farmacêutica, de cerâmica e de graxas lubrificantes, além da fabricação de baterias que fazem parte de vários equipamentos eletrônicos, como computadores e celulares.

Mas o lítio ganhou destaque na economia global devido à sua grande capacidade de armazenamento de energia em um espaço relativamente pequeno, e virou matéria-prima para as baterias que compõem carros elétricos, como explica o geólogo e professor da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Leonardo Azevedo Sá Alkmin.

Produção de lítio no Brasil

A importância estratégica de Minas Gerais na produção de lítio pode ser entendida por meio dos números do Ministério de Minas e Energia: toda a produção do metal em 2023 - estimada em 15,2 mil toneladas de lítio contido avaliadas em R$ 2,7 bilhões - veio do estado, principalmente do Vale do Jequitinhonha, que tem esse nome por causa do rio que corta a região.

O Brasil é o quinto maior produtor mundial do metal, atrás de Austrália, Chile, China e Argentina. De olho em todo esse potencial, o governo de Minas lançou em maio de 2023 na Nasdaq, bolsa de valores dos Estados Unidos que reúne empresas de inovação e tecnologia, o projeto Vale do Lítio, para atrair investimentos voltados à extração, processamento e pesquisa do metal.
Dados do governo de MG apontam que o projeto já atraiu R$ 5,5 bilhões em negócios, permitiu a geração de mais de 10 mil empregos diretos e indiretos e contribuiu para a arrecadação de R$ 55,1 milhões de Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem) paga aos municípios.


Primeira empresa a explorar o potencial do lítio em Minas Gerais, a Companhia Brasileira de Lítio foi fundada em 1985 e está em operações contínuas desde 1991. Atualmente, 750 pessoas trabalham nos processos realizados nas cidades de AraçuaíItinga e Divisa Alegre, e, segundo o CEO da empresa, Vinícius Alvarenga, 95% da demanda de produção é para as baterias.

Da Mina da Cachoeira, em Araçuaí, a CBL retira as rochas que possuem o espodumênio. O local possui galerias que atingem até 220 metros de profundidade e 14 quilômetros de extensão, com capacidade de produção de 45 mil toneladas de concentrado de espodumênio por ano. Na unidade, o material passa ainda por beneficiamento para depois seguir para a planta química, localizada em Divisa Alegre, que fica com a maior parte dos royalties arrecadados com a exploração do mineral.

 
A empresa canadense já investiu R$ 200 milhões nos levantamentos feitos nos municípios de ItingaAraçuaí e Salinas. A expectativa é de que a fase de construção do Projeto Bandeira comece em 2024, com produção comercial que pode chegar a 180 mil toneladas por ano. Inicialmente, o produto tem como foco o mercado internacional, dominado pela China.
 

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